É minha convicção que, para além de todos os pontos negativos e o impacto ambiental causado, o fenómeno turístico encerra em si uma ferramenta bastante importante para a educação ambiental das populações. Quando devidamente regulado, o fluxo turístico nestas regiões permite um contacto direto com populações cujas atividades agrícola e florestal exercem um impacto algo relevante no seu quotidiano.
No extremo da freguesia homónima, encontramos uma pequena aldeia, que cresceu em torno de um vale muito fértil, denominada Reguengo. Foi aqui que fui encontrar a Sra. Marília Martins. Aos 72 anos, afirma com toda a convicção que “é a Terra que nos dá tudo e não há nada que possa negá-lo”. Depois de poucas palavras, percecionei logo traços de uma consciência ambiental inata, que abunda nas gentes deste concelho: “É absolutamente chocante, numa zona como esta, criar resíduos biológicos e deixá-los no contentor do lixo. À exceção dos moradores do centro da Vila, todos podemos ter um pequeno terreno para fazer a compostagem e usá-la nos nossos quintais.” Esta senhora, que coze todas as semanas broa de farinha de trigo e milho que plantou e moeu, proporcionou-me uma agradável meia hora de conversa e no fim acrescentou: “É pena que não passem mais pessoas de fora por cá. Temos tanto para ensinar. Eu bem vejo lá na televisão… (…) Tanta propaganda a calçados e maquilhagem… Dão tanto valor a isso! Eu só queria que chovesse mais um bocadinho de nada”. Terminámos a nossa conversa e comecei a procurar alguns ângulos para ilustrar aquilo que vivi. Captei, inclusive, um espigueiro da aldeia considerado um dos mais antigos da região.
Enquanto tirava umas fotografias, passou o Sr. José com um carro de mão. Pedi que parasse para lhe tirar uma fotografia. Ele acedeu e entretanto comecei a fazer-lhe algumas perguntas sobre o turismo e sobre o património natural no concelho. Sobre o património natural aludiu, de passagem, à cascata da Cabreia e da Fílveda e, de seguida apontou para o topo de uma colina no vale: “Estás a ver aquele sobreiro enorme? É centenário e desde que me lembro é aquela árvore que define a divisão das horas de água do regadio. Diz-se que “ao sol no sobreiro” a água muda para outra pessoa.” Já em relação ao turismo, confessou-me que apenas se lembrava da existência de alguns alojamentos locais, um hotel rural e duas unidades de turismo de habitação. Destes, destacou o papel do Moleiro da Costa Má, por acrescentar às suas estadias uma componente educativa muito forte. Acrescentou também que “é pena que as pessoas não visitem mais o concelho”. Com 53 anos, à pergunta “Pensa que o turismo sustentável é um passo importante, que, direta ou indiretamente, pode contribuir para a preservação do ambiente?”, respondeu “O contacto interpessoal transforma as pessoas. De alguma forma, quando ouvimos alguém a falar com paixão daquilo que faz ou da maneira como vive, também nós próprios nos sentimos apaixonados. Penso que é essa a mais-valia do turismo sustentável em regiões como esta. Põe-nos em contacto direto com as populações, que nos provam diariamente que é possível mudar hábitos, mesmo em relação a turistas citadinos”. Quando já estávamos nas despedidas e cada um voltava para seu lado, ele virou-se, chamou-me e quis alegar que o projeto que catalogou o património arquitetónico, arqueológico e imaterial do concelho não fazia muito sentido, por não ter incluído uma catalogação do património natural. Chamou a atenção para o nome do projeto: GENIUS LOCI. “Sabes o que quer dizer? É a expressão latina para Espírito do Lugar e é isso que as nossas aldeias têm… Têm espírito que poderia ajudar as pessoas a tomar consciência de que apenas existe um planeta e é por ele que todos nós temos de lutar”.
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