O corredor que vai do Farol da Guia, em Cascais, ao Cabo da Roca, no concelho de Sintra, esconde um segredo mundial da botânica. Aí fica o reduto sagrado da Omphalodes kunzinskyanae, mais conhecido por Miosótis-das-Praias, uma planta da classe das angiospérmicas (plantas com flor), endémica desta região.
Trata-se de uma espécie de semente oca, que tem a forma de umbigo e uma cobertura peluda enrolada.” Do aspecto desta semente, libertada pela planta, é que surgiu o nome de “Omphalodes“, que significa umbigo em latim. O botânico que primeiro descreveu o género para a comunidade científica (Miller, durante o século XVIII), viu no formato invulgar do fruto a forma de um umbigo. Kuzinskyanae provem de Kuzinsky, botânico polaco que visitou o nosso país em companhia de Willkomm, o naturalista alemão que descobriu esta espécie em 1889.
Omphalodes kuzinskyanae ou Miosótis-das-Praias é uma espécie da família Boraginaceae e endémica lusitana que apenas se encontra no Parque Natural Sintra-Cascais, apresentando um elevado risco de entrar em vias de extinção. Sendo uma planta anual de pequenas dimensões, germina de Novembro a meados de Fevereiro, a sua floração ocorre geralmente de Março e possui flores branco-azuladas. Omphalodes kuzinskyanae é uma espécie inofensiva e herbácea (raramente alcança mais de de um palmo de altura). O seu período de vida é relativamente curto, terminando em Junho.
Esta espécie desenvolve-se em solos porosos e arenosos, com carbonatos, como é o caso do Abano. Segundo Irene Correia, Engenheira da Agência Cascais Ambiente, Miosótis-das-Praias é uma planta com populações flutuantes, isto é, o número de indivíduos varia muito de ano para ano devido à ação do homem, mas também às condições meteorológicas e a alterações das características dos solos, às quais é muito sensível.
A Agência Cascais Ambiente está a desenvolver um projeto que visa a proteção e conservação desta espécie. Ao longo dos meses de janeiro e fevereiro decorreram ações de plantação de indivíduos jovens. Estes foram desenvolvidos em estufa a partir de sementes recolhidas no habitat natural desta espécie em março e abril de 2013.
Alunos do Colégio Valsassina acompanharam esta ação e estão a desenvolver um estudo que pretende estudar as novas populações e o eventual alargamento da área de distribuição da Omphalodes kuzinskyanae.
O método utilizado foi o dos transectos, recorrendo a áreas quadradas delimitadas por estadas de madeira e cordel. Este método permitiu proceder à contagem de indivíduos desta espécie pela área considerada e acompanhar o seu desenvolvimento durante o período do estudo.
Vários acordos internacionais para conservação da biodiversidade, assinados por Portugal, conferem-lhe o máximo estatuto de protecção, entre os quais a Convenção de Berna e a Directiva Comunitária para a Conservação dos Habitats e da Diversidade Biológica.
Esta espécie endémica, devido ao seu estado vulnerável é alvo da “Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN” e “Plano Nacional de Conservação de Flora em Perigo”, tratando-se de uma espécie prioritária em termos de conservação, estatuto definido por lei. Vários acordos internacionais para a conservação da biodiversidade assinados por Portugal conferem-lhe também o máximo estatuto de proteção. Apesar de o número de locais de fixação ainda não estar completamente definido, afirma-se a diminuição de indivíduos capazes de se reproduzirem, apontando-se como principais causas a urbanização, e como já referido anteriormente, incêndios e espécies invasoras. A população atual da espécie é constituída por cerca de 40.000 a 50.000 indivíduos, valor que apresenta tendência a diminuir. Atualmente subsistem 9 núcleos populacionais, restritos a uma área de cerca de 5,2 hectares. A tendência populacional é de regressão muito acentuada.
As alterações climáticas podem afetar a biodiversidade diretamente (ameaçando a sobrevivência de algumas espécies) ou indiretamente (através do aumento de áreas ardidas ou das invasões biológicas).
Algumas populações, especialmente aquelas que possuem uma distribuição geográfica limitada, pequenas áreas de habitat ou reduzido número de indivíduos (por exemplo, Miosótis-das-Areias), podem não ter capacidades para se adaptarem às rápidas alterações climáticas. A extinção de algumas espécies está relacionada com a baixa taxa de reprodução assim como a baixa capacidade de dispersão.
No litoral de Cascais, junto ao Guincho e à praia do Abano, espécies vegetais tais como o Miosótis-das-Praias (Omphalodes kuzinskyanae), o Cravo-de-Cascais (Diathus cintranus subsp.Cintranus), o Cravo-romano (Armeria pseudarmeria) e o Feto-de-folha-de-hera (Asplenium hemionitis) encontram-se em populações isoladas, sendo muito vulneráveis às condições do meio e às alterações climáticas. Sendo populações cujos indivíduos não são numerosos, estas espécies apresentam um maior risco de extinção.
Por sua vez, as chamadas “dunas cinzentas” (Dunas fixas com vegetação herbácea) e “dunas verdes”, que existem, por exemplo, entre a Praia da Adraga e a Praia Grande, também estão a sofrer consequências das mudanças ambientais. Mais uma vez, merece especial referência o endemismo Miosótis-das-Praias que contava apenas 9 núcleos em 2008, restritos a uma área de 5ha e com um longo historial de regressão.
A menos que se tomem medidas de adaptação e que os outros fatores de pressão sobre estas espécies sejam neutralizados, o declínio continuará. Esta situação agrava-se com a propagação de espécies invasoras.
Este Miosótis é uma espécie rara, quer no número de indivíduos, quer na distribuição geográfica, como também nos habitats onde vive. É por isso que todos os esforços são importantes para a conservação desta espécie.
António Carvalho, Mariana Moreira, Sofia Hemrage
Colégio Valsassina
Escalão 15-18
Agradecimentos:
Este trabalho não teria sido possível de se realizar sem o apoio e disponibilidade da Cascais Ambiente. Agradecemos em particular à Dra Sara Saraiva e à Engenheira Irene Correia, por toda a atenção, simpatia e colaboração.
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