Poluição Luminosa: A natureza clama pela noite

O céu escuro é um património de informação e beleza que deveria estar ao alcance de todos nós. Mas a Poluição Luminosa não acarreta prejuízos apenas a quem gosta de apreciar o Universo. Também compromete uma enorme variedade de seres vivos que vêm a sua existência ameaçada, alterando o equilíbrio ecológico e a biodiversidade do planeta. Também nós sentimos os efeitos da Poluição Luminosa no processo de regulação do sono, condicionando a nossa qualidade de vida. A eficiência da iluminação urbana deve ser feita no respeito pela natureza e evitando o desperdício. A fatura é demasiado pesada.

Poluição Luminosa

Em 1994, um terremoto de magnitude 6.7 causou um enorme apagão em Los Angeles, nos Estados Unidos. Com isso, muitos moradores ligaram para a emergência assustados, a informar que observaram uma “enorme nuvem prateada” no céu, afirmando que a mesma poderia ser a causadora do apagão. Essa “enorme nuvem prateada” era nada mais, nada menos que a Via Láctea, que os habitantes estariam a observar pela primeira vez. O céu mostrou-se pela primeira vez em décadas naquela cidade, e gerou alarme social.

Figura 1- Centro da Via Láctea (La Palma)

Na antiguidade o céu estrelado era um espetáculo magnífico que, acredita-se, tenha deslumbrado o Homem, quer pela grandiosidade, quer pela beleza. Dele se fabricaram histórias e mitos, e do seu conhecimento resultou o calendário cujo entendimento do tempo deu lugar à agricultura e construção das civilizações. Porém, com a descoberta daeletricidade no século XIX e com o surgimento das primeiras iluminações públicas, no fimdaquele mesmo século,oHomem quis preservar o dia durante a noite, principalmente nos centros urbanos, propiciando uma enorme variedade de atividades, envolvendo quantidades de luz progressivamente maiores.

Brilho artificial difuso do céu (SkyGlow)

 A tendência para o excesso abusivo da luz nas cidades gerou o que se designa por Over Illumination, intensidade luminosa excessiva para iluminar adequadamente um espaço urbano, contribuindo não só para um enorme gasto de energia e de recursos, com tudo o que daí advém, mas também para poluir a noite, considerando que a maior parte dessa luz é emitida para cima (em ângulos horizontais e superiores), acaba espalhada por aerossóis, neblinas ou por pequenas partículas suspensas na atmosfera. Esta dispersão origina um brilho difuso a que vulgarmente se designa por SkyGlow pinta o céu de luz, ofuscando tudo o que noite podia revelar, e criando enormes problemas ambientais e de saúde humana.

Figura 2-SkyGlow visto do Bioparque (S.Pedro do Sul)

Problemas causados pela Poluição Luminosa

 Astronomia: O Skyglow obrigou à deslocação de observatórios construídos próximos de cidades para regiões remotas ou à tomada de medidas para a proteção do céu nas regiões próximas. Alguns tornaram-se praticamente obsoletos para fins científicos, tal passou a ser o grau de poluição luminosa nos locais em que se encontravam. Os astrónomos amadores percorrem por vezes centenas de km para poderem ter o privilégio de observar o Universo, prazer cada vez mais inacessível para o cidadão comum.

Recursos naturais, Clima e Economia : Toda a energia que consumimos tem impactos na natureza, seja na extração e transformação de combustíveis fósseis, seja na sua utilização. Este consumo excessivo de energia luminosa, representa por isso uma contribuição para o aquecimento global do planeta e alterações climáticas. Em 2016, Portugal assinou o Acordo de Paris relativo às alterações climáticas, pelo que a redução da iluminação pública e de exterior supérflua representaria mais uma contribuição para a redução de emissão de CO2 de origem antropogénica e forma de honrar esse compromisso sem prejuízo para a nossa qualidade de vida, ao mesmo tempo que beneficiaria profundamente as economias.

          Fauna e Flora: São múltiplos os exemplos do prejuízo nos ecossistemas relacionados com a Poluição Luminosa. As aves migratórias desorientam-se com as luzes da costa ou das cidades colidindo com edifícios ou perdendo-se nas suas migrações. No Canadá, a organização Fatal Light Awareness Program, fundada em 1993, tem diversos programas de sensibilização para este problema lembrando que, só nos EUA, morrem entre cerca de 100 a 1000 milhões de aves todos os anos devido a este problema.

Nos répteis, salientam-se algumas espécies de tartarugas marinhas, cujas crias, logo após a eclosão dos ovos nas praias, se em vez de se dirigem de imediato para o mar, desorientam-se e dirigem-se em sentido contrário sendo atropeladas ou morrendo por exaustão. Após a pressão realizada pelas entidades como a International Dark-Sky Association, algumas regiões nos EUA desligam ou reduzem as luzes na altura da eclosão dos ovos.

Também os insetos são atraídos pela luz, morrendo de exaustão, ou pequenos mamíferos que ficam expostos aos predadores, provocando desequilíbrio nos ecossistemas, e ameaçando muitas espécies.

Não só os animais acusam o problema. Algumas plantas sofrem também “stress” pela contínua exposição à luz, ou de forma indireta, os efeitos da luz artificial nos polinizadores (insectos), fundamentais para a vida na Terra, reflete-se na flora local (Nature, Agosto de 2017).

Saúde Humana: Na década de 90, os cientistas descobriram um terceiro tipo de célula sensível à luz no olho humano, distinta das células já bem conhecidas (cones e bastonetes), que contém “melanopsina”, um fotopigmento que desempenha a função de identificar e rastrear o ciclo dia-noite. A melanopsina tem um pico de sensibilidade à luz azul, a mesma controla a produção de “melatonina”, uma hormona que faz com que nos sintamos sonolentos à noite. Quando as células da melanopsina detetam luz, normalmente durante o dia, a produção de melatonina é suspensa, fazendo com que nos sintamos mais despertos. Quando está escuro, as células da melanopsina não detetam luz e produzem melatonina que induz o sono. A exposição à luz azul, durante a noite, por longos períodos de tempo, suprime a produção de melatonina à noite que possivelmente pode resultar em problemas do sono. Assim, um crescente número de estudos indiciam relações entre a poluição luminosa e as perturbações no sono, risco de obesidade, depressão e diabetes.

Como reduzir os impactos da Poluição Luminosa

 A maneira mais eficaz é simplesmente desligar ou reduzir a quantidade de iluminação. A mudança da luz branca para amarela faz também diferença.

 

Figura 3-Luminárias em Águeda

A escolha de luminárias eficientes que projetem a luz para onde é necessária reduz o consumo energético e protege a vida no planeta, bem como a nossa saúde. Águeda mudou as suas luminárias por sistemas mais eficientes e ajustados à área que pretendem cobrir.

O diagrama abaixo resume a eficácia de formas de reduzir a poluição luminosa.

Imagem 4- Redução da Poluição Luminosa

Temos que cuidar do Planeta para que ele cuide de nós.

 

 

Gonçalo Santiago Ferreira