A cebola: uma cultura sustentável passada de geração em geração

No distrito de Coimbra, entre campos cultivados e tradições enraizadas, há um cultivo que resiste ao tempo: a sementeira e a plantação da cebola. Mais do que um simples ingrediente representa uma tradição familiar e um exemplo de agricultura sustentável. Pretende-se com esta reportagem desvendar os mistérios deste bolbo tão presente na gastronomia portuguesa e na dieta mediterrânica e quem sabe desvendar o motivo de nos fazer chorar.

A cebola é o nome popular da planta cujo nome científico é Allium Cepa e teve origem no continente asiático.

É um dos legumes mais consumidos no mundo e, por isso, utilizado na maioria das cozinhas.

Luís Lavrador e João Pedro Gomes

João Pedro Gomes, professor doutor em história da Gastronomia pela Universidade de Coimbra, afirma que “a cebola tem origem genética no Próximo Oriente e uma presença milenar na nossa culinária. Na Babilónia era usada como aromatizante há quatro ou cinco mil anos. Acrescenta ainda que a cebola e o azeite, sob a forma de refogado, são uma das principais características da culinária muçulmana medieval. Aliás, a presença de refogado no sul da europa é um exemplo do cruzamento de culturas no Mediterrâneo, sendo menos utilizado no norte da europa.”

O chefe Luís Lavrador, antigo cozinheiro da seleção nacional de futebol, refere que “a cebola era um alimento base da alimentação no Egipto. Os romanos já a usavam também na Península Ibérica, apesar de ser desconhecido se a civilizações pré-romanas a utilizava, neste espaço. É um alimento bastante referido na Bíblia.”

Além do referido valor histórico, é também um alimento muito saudável, com um grande teor de água e poucas calorias. A cebola é composta por sais minerais e vitaminas, nomeadamente a vitamina C, a vitamina E, as vitaminas do complexo B (ácido fólico, B3 e B6), potássio, fósforo, cálcio e magnésio. Apresenta muitos benefícios para a saúde, uma vez que ajuda a controlar doenças hepáticas, diabetes, colesterol, glicemia, entre outras.

Como surge nas nossas mesas? E como chegou aos dias de hoje o seu cultivo tradicional?

O casal Cruz e o seu filho mais velho, assim como a D. Cidália, todos habitantes do concelho de Penacova, preservam esta cultura e explicam melhor este ofício, revelando os segredos que tornam este cultivo tão especial e amigo do ambiente. Reforçam que este sempre foi um património familiar que vale a pena preservar. Será assim?

De acordo com Artur José Cruz, filho mais velho do casal, “a sementeira do cebolo começou como uma brincadeira, mas também porque os meus pais estão a ficar com alguma idade. Comecei por pedir algumas sementes aos meus pais para fazer uma pequena experiência, verificar se o solo da aldeia onde vivo também se adaptava à produção do cebolo. Com alguns conhecimentos que já tinha e com outros que fui adquirindo junto dos meus pais e amigos, como a D. Cidália, comecei a fazer a produção, seguindo os ciclos do processo.”

Produção da semente do cebolo.

Segundo a D. Cidália Ferreira, produtora de cebolo, “o processo começa com a plantação das cebolas no minguante de março. Normalmente, a semente está madura em agosto e é apanhada. Seguidamente, secam-se as cabeças da semente, debulham-se e limpam-se. Depois de limpas, põem-se as sementes em água e as que estão boas ficam em baixo e as chouchas ficam a boiar. A semente é colocada num local abrigado e ao sol para secar. Posteriormente, é armazenada até à sementeira do ano seguinte. A sementeira ocorre quando a terra está bem fertilizada com estrume dos cavalos, das galinhas e dos coelhos, no minguante de outubro até fevereiro. Para além disso, cobrimos as sementes com uma camada fina de manta morta (matéria vegetal seca), que recolhemos debaixo dos pinheiros na Serra do Bussaco. Quando o cebolo começa a ter um certo tamanho, está pronto a ser transplantando, ou seja, muda-se de terra para criar as cebolas que bem conhecemos. Consoante o tempo, a cebola fica boa para arrancar. Brevemente começa o ciclo de novo”.

A sexagenária acrescentou ainda que, se tivermos duas qualidades de cebolo, temos de ter 50 metros de distância entre as duas plantações, para não corrermos o risco de as abelhas, ao fazerem a polinização, alterarem a qualidade biológica da semente.

Tranças de cebolas prontas a comercializar

O casal Cruz sublinha a importância do tipo de lua mais adequada à sementeira e também da necessária manutenção ou limpeza de ervas daninhas até o cebolo atingir 15 a 20cm. Cinco meses depois replanta-se, após isso tem de ser sachado, regado até a cebola ficar grande. São 5 meses de trabalho árduo. Quando as cebolas estão grandes arrancam-se e entrançam-se, para melhor armazenamento.

 

Grandes cebolas: a generosidade da mãe natureza.

Concluindo, o cultivo da cebola é muito mais do que um processo agrícola, é uma ligação à terra, à tradição e à sustentabilidade. Com técnicas passadas de geração em geração, esta cultura continua a ser um exemplo de como a agricultura pode ser feita de forma natural e equilibrada. Todos os testemunhos referem que não há desperdício neste cultivo. Até as tranças da cebola servem de alimentação para os animais, cujo estrume volta para a terra, fertilizando-a. É produzida, localmente, por todo o território, pelo que ajuda as economias locais mais desfavorecidas, especialmente pequenos produtores. Sendo assim, a sua pegada ecológica é reduzida, pois não necessita de longos transportes.

Afinal a cebola faz-nos chorar, porquê?

A cebola faz-nos chorar, porque possui células com uma substância química que contém enxofre. Ao cortar a cebola, rompem algumas células, libertando a substância que, em contacto com os olhos, os irrita.

 

https://www.ufmg.br/ciencianoar/wp-content/uploads/2016/04/CPT-ET02_57-ascebolasnosfazemchorar.pdf

https://saboreiaavida.nestle.pt/bem-estar/cebola