Cooperativa Polivalente – O dia-a-dia de um médico veterinário num Zoo

Entrevista a Arlete Sogor

Há quantos anos trabalha no Jardim Zoológico de Lisboa como médica veterinária?

Como Veterinária especializada em mamíferos marinhos há 28 anos. Vim para Portugal em 1989 e comecei a trabalhar com Golfinhos-de-miami para a empresa que hoje gere o Zoomarine. No Jardim Zoológico, não sei ao certo, mas desde a fundação ou anterior à inauguração da Baía dos Golfinhos.

Quais são os animais mais difíceis de tratar?

Não há um animal mais difícil para lidar. Cada um tem a sua maneira de ser, as suas características. Temos de saber muito sobre a biologia e vida das espécies, para poder ultrapassar esta questão. Claro que o facto de os animais marinhos estarem dentro de água torna tudo muito diferente, mas estes são inteligentes, são treináveis.

Qual a diferença entre o veterinário de zoo e um veterinário clínico?

A Medicina veterinária é uma profissão absolutamente ampla. Um veterinário pode ser clínico, inspetor alimentar, trabalhar na indústria farmacêutica, zootecnia na parte de crescimento e produção de pecuária. Tudo isto é ser um médico veterinário. O que é ser um veterinário de zoo? É uma polivalência enorme. Temos de estar preparados para atender um passarinho, uma iguana, um herbívoro de grande porte, um mamífero marinho, qualquer coisa. Claro que ninguém sabe tudo, a experiência e a evolução dos anos ajuda muito. E acima de tudo, estar atualizado e frequentar reuniões internacionais. Muitas das vezes quando alguns problemas se põem, recorre-se a colegas, especialistas em determinadas áreas. Aqui também no nosso dia-a-dia, temos especialistas que se deslocam essencialmente para fazer raios-X e ecografias.

É especializada em mamíferos marinhos. O que a atraiu para esta área?

Quando estava na faculdade, sabia que não queria trabalhar com cães e gatos. Não porque não gostasse dos animais, mas porque não tinha paciência para os donos, continuo a não ter (risos). O que eu fiz durante toda a faculdade foi uma série de estágios em aquariocultura e aquariofilia. Gostava mais de água e de mar… Depois, por uma casualidade, na última semana de aulas, assisti à necrópsia de um Leão-marinho em São Paulo, que tinha morrido recentemente. Soube quem era o veterinário responsável e fiquei como estagiária. O médico veterinário responsável foi tirar um curso para os Estados Unidos da América, mas não avisou ninguém. Por isso, os donos ficaram muito preocupados e perguntaram se eu queria trabalhar lá. Nessa altura, tinha seis meses de formação e muito conhecimento sobre biologia marinha, que pouca gente tinha nessa altura. Portanto, por coincidência, foi o que aconteceu.

No tratamento de animais pertencentes a espécies em estado crítico, há uma pressão adicional sobre os médicos veterinários?

Não podemos pensar nisso. Temos de conseguir. É um animal, não interessa se é uma lagartixa ou se é um órix. Temos de pensar assim, senão não conseguimos resistir à pressão. É um animal que precisa da nossa ajuda. É um médico a tratar de um paciente.

Os golfinhos não podem ser anestesiados, visto que a sua respiração não é um ato inconsciente, não podendo entrar num estado de sono profundo. Nestes casos, como é que se procede ao seu tratamento no caso de uma intervenção cirúrgica?

Em princípio não se faz cirurgia. Hoje em dia, são realizadas intervenções por laparoscopia, mas mesmo assim a sutura é bastante difícil, porque estes possuem uma camada de gordura e necessitam de estar na água. A cirurgia não é um procedimento habitual nos golfinhos. Fazemos tudo para evitar chegar a esse ponto.

De que forma se procede com os animais aquáticos no caso de uma cirurgia? O hospital veterinário tem condições?

Nos Leões-marinhos sim. Nós operámos os animais agora em janeiro às cataratas e eles foram todos transportados para o bloco operatório, sedados, anestesiados, como qualquer mamífero. Claro, que existe especificidades na traqueia e no reflexo de anestesia dos Leões-marinhos. Mas de resto, é como um mamífero qualquer. Portanto, a preparação e o estudo prévio é muito importante.

O Hospital veterinário do Jardim Zoológico de Lisboa possui equipamento para a realização de todo o tipo de cirurgias? Já houve casos em que tiveram de transportar o animal para outro hospital veterinário ou colaborar com outras instituições?

Sim, a colaboração é uma regra. Quer com médicos de Medicina Humana, quer com colegas de outros países, quer com fabricantes de equipamentos que muitas vezes o fornecem para cirurgias específicas. É quase impossível ter um Jardim Zoológico equipado para este mundo todo. Por isso, com recurso e colaboração de várias áreas conseguimos ultrapassar estes problemas.

Tem algumas sugestões para um aspirante a médico veterinário?

Primeiro, tem de estudar a famosa matemática, físico-química e passar por isso tudo. Depois, ter os horizontes abertos aquando da entrada na faculdade e não definir imediatamente a especialidade a seguir. Até porque é uma profissão muito ampla. É preciso ter sangue frio e decidir de forma racional e ponderada. Em suma, é essencial ter sempre uma mente aberta, pois é uma profissão que tem várias variáveis.

 

Grupo 2: Mafalda Gomes, João Souto, Tomás Ribeiro

Mafalda Gomes, João Souto, Tomás Ribeiro