“Feliz de quem não exige nada da vida mais do que ela espontaneamente lhe dá, guiando-se pelos instintos dos gatos, que buscam o sol quando há sol, e quando não há sol, o calor onde quer que esteja.” Fernando Pessoa
É o acaso que junta o improvável. E o improvável foi conseguir captar um momento único de relaxe do nosso amigo gato no que deveria ser um SPA para a sua condição de ser vivo.
O gato (Felis silvestris catus), também conhecido como gato caseiro, gato urbano ou gato doméstico é um animal da família dos felídeos, muito popular como animal de estimação. A primeira associação com os humanos da qual se tem notícia ocorreu há cerca de 9500 anos. A subfamília Felinae, que agrupa os gatos domésticos, surgiu há cerca de 12 milhões de anos, expandindo-se a partir da África subsariana até alcançar as terras do atual Egito. Acredita-se que o gato-selvagem-africano (Felis silvestris lybica) era seu antepassado imediato; no entanto, evidências genéticas assinalam que os gatos domésticos atuais partilham uma procedência direta com os gatos selvagens do oriente médio. E a julgar pela foto, neste momento, o gato partilha o seu dia a dia urbano com o rasto que o Homem deixa no “seu relaxe”. É previsível que gatos selvagens que vivem em ambientes urbanos tenham expectativas de vida reduzida, o que se compreende pelo momento captado em plena rua de Sabrosa. O Homem, na sua ânsia de dominar o meio ambiente, deixa habitualmente rastos do seu trabalho de construção, conhecido por entulho. É variadíssimo o material que compõe um entulho, conforme a sua proveniência: sacos vazios, cerâmicas partidas, tijolos, betão, ferro, madeiras, pedaços de papel e…restos de TUBOS. E com isso convive, lado a lado, o nosso gato, quase como falsa palmeira num SPA idílico.
Ao procurar o sol, dentro duma caixa de plástico estrategicamente colocada a seu favor, o nosso gato sabrosense ignora com desprezo aquele “verde” displicentemente abandonado a seu lado: na tentativa de melhorar a vida humana em ambiente urbano, o Homem colocou tubos enterrados para proteção de cabos usados em telecomunicações, sem ter o cuidado e sem sentir a obrigação de os acondicionar devidamente depois. Estes tubos são feitos de polietileno, um homopolímero sintético (macromolécula) que se obtém a partir da polimerização de adição de um único tipo de monómero, o etileno, de fórmula química CH2=CH2 (designado, de acordo com a IUPAC, eteno). O eteno é obtido industrialmente por meio do cracking catalítico do petróleo (combustível fóssil – fonte de energia não renovável), que é um processo em que as ligações nos hidrocarbonetos de cadeias longas são quebradas originando alcanos de cadeias menores e alcenos como o eteno. Devido à sua longa durabilidade, apresenta-se sempre a necessidade de reciclar este tipo de material: de um modo geral, a reciclagem dos plásticos apenas exige cerca de 10% da energia utilizada no processo de fabrico do plástico original. Os materiais resultantes são utilizados no fabrico de novos produtos, diferentes dos originais, mas de grande utilidade. A reciclagem permite a poupança da matéria-prima original (o petróleo) e retira estes plásticos do meio ambiente onde demorariam dezenas de anos (50 ou mais) a degradarem-se. Dezenas de anos que o nosso gato não tem. Dezenas de anos que os tubos verdes serão testemunhas inertes da passagem do tempo e de todos nós. De referir que este material não apresenta qualquer tipo de utilidade, neste momento. Nem ao nosso gato, embora talvez pudesse servir-lhe de espreguiçadeira e permitir-lhe refastelar-se ao sol…talvez pudesse dar-lhe sombra…talvez o nosso gato pudesse usá-lo para comunicar com outros: “ Estou? Olá, é o Minga. Por aqui o sol está maravilhoso, quente, intenso. E aí, em Nova Iorque?”… mas não. São tubos mortos, cuja existência foi esquecida, deixada ao abandono, fazendo parte da grande família dos entulhos, que agrupa o entulho doméstico, da construção e industrial, surgido das atividades do ser vivo – Homem. “Os cientistas estimam que os seres humanos se ramificaram de um ancestral comum aos chimpanzés – o único outro hominídeo vivo – num intervalo temporal entre 5 e 7 milhões de anos atrás. Diversas espécies de Homo evoluíram e agora estão extintas. Estas incluem o Homo erectus, que habitou a Ásia, e o Homo neanderthalensis, que habitou a Europa. O Homo sapiens arcaico evoluiu entre 400 000 e 250 000 de anos atrás”. Evoluiu. Será?
“De todas as criaturas de Deus, somente uma não pode ser castigada. Essa é o gato. Se fosse possível cruzar o Homem com o gato, melhoraria o Homem, mas pioraria o gato.” Mark Twain
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