Durante a segunda metade do século XX assistiu-se à tomada de consciência relativamente à degradação ambiental provocada pela crescente industrialização, pelo aumento demográfico e pelo consumo excessivo dos recursos naturais. O conceito de Desenvolvimento Sustentável surgiu em 1987, no Relatório de Brundtland, como uma forma de tentar resolver estas alterações na qualidade ambiental, no desenvolvimento económico e na estrutura social, tendo em linha de conta as gerações presentes e futuras. A partir dessa altura, ficou claro que era necessário haver um compromisso por parte da sociedade no sentido de tornar mais sustentável o seu estilo de vida. Foi neste contexto que surgiram inúmeras iniciativas na tentativa de inverter a situação, das quais se destaca o Acordo de Paris, que entrou em vigor a 4 de novembro de 2016 e visa combater eficazmente as alterações climáticas, através da redução das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) e a definição dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável para 2030, fixados numa cimeira das Organização das Nações Unidas. Dos 17 objetivos propostos, destacam-se o número 7, referente às energias renováveis e o número 13, relacionado com as alterações climáticas.
As políticas energéticas na União Europeia
Em 2010 foi lançada a estratégia Europa 2020 (http://ec.europa.eu/europe2020), que visava não só a saída da crise, mas também colmatar as deficiências do modelo de crescimento. Foram definidos cinco objetivos principais a atingir até ao final de 2020, sendo um deles relacionado com o clima/energia. Este é constituído pelos seguintes objetivos estratégicos (conhecidos por “20-20-20”): reduzir as emissões de GEE em 20% (ou em 30%, se forem reunidas as condições necessárias) relativamente aos níveis registados em 1990; obter 20% da energia a partir de fontes renováveis e aumentar em 20% a eficiência energética. Mais recentemente, tendo em conta o Acordo de Paris, a Comissão Europeia lançou um pacote de medidas com o objetivo de fornecer uma estrutura legislativa estável necessária para facilitar a transição energética. Em 2018, a Comissão Europeia apresentou o seu plano estratégico de longo prazo para a economia em 2050 – “A Clean Planet for All” cujo objetivo é confirmar o compromisso da Europa de liderar a ação climática global e apresentar uma visão que possa levar à obtenção de emissões próximas do zero de GEE até 2050, por meio de uma transição socialmente justa e de maneira eficiente (https://ec.europa.eu/clima/policies/strategies/2050_pt).
As políticas energéticas em Portugal
Na Resolução do Conselho de Ministros nº 29/2010, o Conselho de Ministros aprovou, a 18 de março, a Estratégia Nacional para a Energia com um horizonte de 2020 (ENE 2020). Esta Estratégia Nacional para a Energia definiu uma agenda para a competitividade, o crescimento e a independência energética e financeira do País, através da aposta nas energias renováveis e na promoção integrada da eficiência energética. Pretendeu aumentar a segurança de abastecimento e a sustentabilidade económica e ambiental do modelo energético preconizado, contribuindo para a redução de emissões de CO2 a nível local, regional e global.
Na Resolução do Conselho de Ministros n.º 20/2013, o Conselho de Ministros aprovou, a 10 de abril, o Plano Nacional de Ação para a Eficiência Energética (PNAEE) para o período 2013-2016 e o Plano Nacional de Ação para as Energias Renováveis (PNAER) para o período 2013-2020. No quadro das metas europeias «20–20–20», foi estabelecido para Portugal, para o horizonte de 2020, um objetivo geral de redução no consumo de energia primária de 25% e um objetivo específico para a Administração Pública (AP) de redução de 30% (Diário da República, 1.ª série — N.º 70 — 10 de abril de 2013) e no plano da utilização de energia proveniente de fontes endógenas renováveis, pretende-se que 31% do consumo final bruto de energia e 10% da energia utilizada nos transportes provir de fontes renováveis (Tabela 1). O Programa Nacional para as Alterações Climáticas 2020/2030 (PNAC 2020/2030), que visava garantir o cumprimento das metas nacionais em matéria de alterações climáticas, tinha como objetivos promover a transição para uma economia de baixo carbono, gerando mais riqueza e emprego e assegurar uma trajetória sustentável de redução das emissões de GEE de forma a alcançar uma meta de -18% a -23% (Tabela 1) em 2020 e de -30% a -40% em 2030, em relação a 2005.
Metas Nacionais 2020 | Metas Nacionais
2030 |
Metas UE 2030 | |
Emissão GEE | -18% a -23% | -45% a -55%* | -40%** |
Eficiência Energética | 25% (30% na AP) | 35% | 32,5% |
Energias Renováveis | 31% | 47% | 32% |
Tabela 1- Metas Nacionais para 2020 /2030 e Metas UE para 2030 (Fonte PNEC). * perspetiva mais ambiciosa que a proposta pelo PNAC **em relação a 1990 (Fonte PNEC) |
Em 2019, foi lançado o Plano Nacional Integrado Energia-Clima (PNEC), que substitui o PNAEE e o PNAER, para o Horizonte 2021-2030, onde “Portugal reafirma o seu firme compromisso de ser neutro em emissões de GEE até ao final da primeira metade do século”. As metas para 2030 são mais ambiciosas do que as impostas para 2020, mais ambiciosas do que as inicialmente propostas para 2030 no PNAC e mais ambiciosas que a nível Europeu (União Europeia -EU) (Tabela 1).
As políticas energéticas no Município do Porto
De acordo com o “PLANO DE AÇÃO PARA A ENERGIA SUSTENTÁVEL da CIDADE DO PORTO”, de 2010, a cidade subscreveu o Pacto dos Autarcas na cerimónia fundadora em 10 de fevereiro de 2009, em Bruxelas, no seguimento das metas 20-20-20 da Comissão Europeia. Este pacto constitui um desafio ambicioso que procura desenvolver uma sociedade mais sustentável, lutando contra o aquecimento global e tendo como principal objetivo a redução das emissões de CO2 em mais de 20% até 2020, com a ajuda de medidas no domínio da eficiência energética e da promoção de energias renováveis suportadas em planos de ação para a energia sustentável. Os objetivos deste pacto têm em conta os resultados da matriz energética de 2004. Segundo esta matriz, as emissões de CO2 eram de 1 034 300 toneladas. Relativamente à energia, o vetor energético que mais usava energia primária (52%) era a eletricidade (energia final, obtida por conversão a partir de uma forma de energia primária), sendo que 58% da energia primária estava afeta aos edifícios. Estando esta anergia ainda fortemente dependente de combustíveis fósseis e de tecnologias de conversão de reduzida eficiência, a taxa de emissão de CO2 associada à energia estava particularmente agravada no Porto. Numa atualização realizada em 2008, verifica-se que o valor de emissões de CO2 sofreu apenas um ligeiro decréscimo, relacionado com uma diminuição da população. No que respeita à eletricidade, embora tenha crescido o consumo, ocorreu uma redução da energia primária que ilustra a melhoria da eficiência da oferta energética, pelo impacto das renováveis na eletricidade, por exemplo. Prevê-se no referido pacto da cidade do Porto uma redução de 45% (em relação a 2004) até 2020, redução esta voluntária e que excede as metas de redução de 20% da EU. Estima-se, no mesmo pacto, um aumento da eficiência energética da ordem dos 20% (em relação a 2004) e, embora a perspetiva fosse a de garantir que 20% da energia tivesse origem em fontes renováveis, afirmava-se que seria pouco provável. De acordo com informações constantes no site da CMP, o Município do Porto, juntamente com a LIPOR (Sistema Intermunicipal de Gestão de Resíduos da qual o Porto é o principal acionista) e com a Universidade Católica, implementou o Projeto “FUTURO SUSTENTÁVEL – Plano Estratégico de Ambiente para o Grande Porto”, que ao longo de 3 anos (2003-2007) desenvolveu um diagnóstico regional que culminou com um plano de ação para tornar a região mais sustentável. Em 2014, aprovou-se o Plano Municipal de Ambiente – com um horizonte de implementação para além do atual ciclo político (2020), que procura corresponder aos desafios do desenvolvimento.
A nossa perspetiva
Efetuou-se uma pesquisa na internet, foram efetuados diversos contactos, nomeadamente, com a Agência de Energia do Porto (AdE Porto) e com o Pelouro do Ambiente e Inovação da Câmara Municipal do Porto. Este último forneceu-nos alguns dados, nomeadamente, os relativos à redução de emissões de GEE. A análise será baseada nos valores relativos à execução da ENE 2020 a nível nacional para os anos em que há informação disponível (até 2016), nos valores de redução de GEE para o Município do Porto, e em alguns dados, do mesmo período e do Município do Porto, obtidos através do Portal Pordata.
Resultados em 2016 | ||
Porto* | Portugal** | |
Energia Renováveis | – | 28,5% |
Eficiência Energética | – | 23% |
Emissão GEE (Porto/Portugal) | -26,3% | -22% |
Tabela 2- *Dados fornecidos pela CMP* (Câmara Municipal do Porto) pelo PNEC** (Plano Nacional de Energia e Clima), comparação entre 2014 e 2016. |
Pelo menos em ambições, Portugal está no bom caminho. Verifica-se que a nível nacional tem havido uma progressão contínua na consecução dos objetivos em matéria de energias renováveis. Dados provisórios do Eurostat mostram que, em 2017, Portugal alcançou uma quota global de energias renováveis no consumo final de energia de 28,1%, que apesar de ser menor que a quota alcançada em 2016, de 28,5% (Tabela 2), continua acima da trajetória indicativa para cumprir a meta vinculativa nacional de 31% em 2020, referida no PNAER, tal como já foi referido.
O objetivo indicativo nacional para Portugal referente ao consumo de energia em 2020 não deve exceder os 22,5 Mtep de energia primária para 2020 (redução de 25% nas projeções de 2007)(PNAEE, 2017), tal como já foi referido. Em 2016, Portugal apresentava uma eficiência energética de 23% (Tabela 2). Os dados provisórios do Eurostat mostram que, em 2017, Portugal teve um consumo de energia primária de 22,8 Mtep, portanto, 1,3% superior ao nível-alvo (22,5 Mtep) e um consumo final de energia (17,4 Mtep) que parece estar 4,9% abaixo da meta para 2020 (16,6 Mtep). Tendo isto em conta, em termos de eficiência energética, Portugal ainda precisa de alguns esforços para manter o consumo de energia sob controlo nos próximos anos.
Em termos de redução de emissão de GEE, em 2016, Portugal conseguiu uma redução de 22% (Tabela 2), o que está dentro dos padrões estabelecidos para 2020, mas bastante longe do que se pretende para 2030.
Dados fornecidos pela CMP, relativos a 2016, indicam que a utilização de eletricidade continua a constituir a maior fatia do uso de energia primária no Município do Porto, tendo representado 35% do uso de energia final e 51% do uso de energia primária. Este facto reflete-se também nas emissões de GEE associadas a esse vetor, representando 47% das emissões de GEE do total do município. Nesse mesmo ano, o setor que teve maior peso no município foi dos transportes com 43% do uso de energia final, embora 33% uso de energia primária. Em relação às emissões de GEE, o setor dos transportes foi responsável por 39% das emissões de GEE do total do município.
Entre 2004 e 2016, assistiu-se a uma redução de 26,3% de emissão de GEE (Tabela 2), que representa uma redução superior à das metas para 2020, propostas no Pacto de Municípios, em 2010 e a uma redução de 15, 3% de energia primária, entre 2014 e 2016. De acordo com a tabela 3, ocorreu uma redução de cerca de 15% referentes ao consumo total de energia elétrica na cidade do Porto, no período entre 2010 e 2017, um valor bastante significativo e que está de acordo com os dados fornecidos pela CMP. Estes dados demonstram o esforço que está a ser feito pela CMP.
Ano |
Consumo de energia elétrica kWh (quilowatt-hora) |
% de redução face ao ano anterior |
Ano |
Consumo de energia elétrica kWh (quilowatt-hora) |
% de redução face ao ano anterior |
2010 |
1.411.815.403 |
– |
2014 |
1.207.239.364 |
-2% |
2011 |
1.326.362.270 |
-6% |
2015 |
1.201.001.752 |
-1% |
2012 |
1.279.196.305 |
-4% |
2016 |
1.225.557.820 |
-2% |
2013 |
1.231.967.901 |
-4% |
2017 |
1.195.433.690 |
-2% |
Tabela 3 – Valores registados pela Pordata, sobre o consumo de energia elétrica total na cidade do Porto. |
Apesar de um intensivo trabalho de pesquisa, não foi possível obter os valores relativos à eficiência energética e à fração de energia proveniente de fontes renováveis referentes ao Município do Porto.
A luta contra as alterações climáticas deve continuar, por isso, de acordo com a Agência de Energia do Porto, em abril de 2019, o Porto foi mais longe e comprometeu-se a reduzir para metade as emissões de GEE, face ao ano de 2004. O Porto dá assim mais um passo para o cumprimento das metas estabelecidas pela União Europeia e pelo Acordo de Paris. As metas propostas são apenas um pequeno passo para inverter a situação do nosso planeta, pois se estas não forem cumpridas não servem de nada. Talvez sejam necessárias medidas mais drásticas.