Ribeira da Lage, em Oeiras: sinais de contaminação comprometem potencial ecológico

Há espécies que ajudam a estudar os ecossistemas em que habitam, pela capacidade de integrar e refletir as condições do meio. É o caso dos macroinvertebrados bentónicos, usados num estudo para avaliar a qualidade ambiental da Ribeira da Lage, em Oeiras. Identificaram 16 famílias destes animais, o que segundo o índice biológico BMWP revela sinais de contaminação.

Os rios e as ribeiras são fundamentais para o equilíbrio dos ecossistemas. Por isso, é tão importante garantir a sua proteção.

A determinação da qualidade biológica das águas pode ser feita recorrendo a macroinvertebrados bentónicos (animais que vivem no substrato de fundo de ecossistemas aquáticos pelo menos, durante parte de seu ciclo de vida onde se incluem, entre outras, larvas de insetos, anelídeos e moluscos). “São a base da cadeia trófica ribeirinha, servindo de alimento a crustáceos, peixes, anfíbios e aves, e são sensíveis a situações de contaminação sendo capazes de integrar e refletir as condições do meio (são bioindicadores)” afirma a Bióloga Sara Correia, da Associação Zero.

A importância deste assunto levou um grupo de alunos do Colégio Valsassina a desenvolver um estudo. Procuraram avaliar a qualidade biológica da Ribeira da Lage através do Índice BMWP (Iberian Biomonitoring Working Party)[1].

Esta ribeira tem como principais impactes “a deposição indevida de lixo, o assoreamento, a presença de espécies invasoras e a artificialização das margens”, afirma Selma Rodrigues, do Departamento de Ambiente da Câmara de Oeiras.

O troço escolhido para o estudo localiza-se na freguesia de Porto Salvo, no concelho de Oeiras. Na envolvente, o solo é ocupado por zonas urbanas e a norte, encontram-se algumas atividades industriais, o que poderá justificar a observação de algum lixo nas margens (latas de refrigerante, papel, cartão, copos e sacos de plástico). António Silva, morador na região, considera que “a existência de lixo neste local tem vindo a melhorar nos últimos anos”. Selma Rodrigues justifica que o município de Oeiras “procede à limpeza e manutenção regular das linhas de água do concelho, nomeadamente em relação ao controlo de vegetação invasora, o que contribui para a proteção dos ecossistemas e para evitar problemas de saúde e/ou de segurança pública”.

Localização do local em estudo (38.709448, -9.313665).

Para a captura de macroinvertebrados foram efetuados arrastos, ao longo de um troço de cerca de 10 metros, com uma rede de mão. A amostragem foi efetuada de jusante para montante, e foi realizada de modo a remover, ressuspender e capturar os organismos presentes no substrato.

Técnica do arrasto para captura de amostras biológicas

       

Trabalho de campo

     

Amostras recolhidas no campo

Foram identificadas 16 famílias, o que se traduz num valor de IBMWP de 86 pontos, sugerindo que são evidentes alguns sinais de contaminação nas águas desta Ribeira.

                           

Observação e análise, em laboratório das famílias de macroinvertebrados bentónicos

                            

Amostras de indivíduos da família Erpobdellidae Amostras de indivíduos da família Oligochaeta

 

Famílias identificadas e Cálculo do IBMWP

O resultado obtido parece encontrar apoio nos estudos desenvolvidos pela Cascais Ambiente, segundo os quais em 2014 a Ribeira da Lage, apresentava um elevado número de espécies nativas ao nível da fauna piscícola (durante o trabalho de campo foi possível encontrar um exemplar da espécie Boga portuguesa, que há alguns anos atrás se pensava extinta neste local[1]), apesar da qualidade da água ter um nível considerado inferior (“poluída”), o que foi também apontado no estudo de 2015[2]. Sobre a biodiversidade aqui existente, Selma Rodrigues, explica que está atualmente a decorrer um trabalho de levantamento da biodiversidade municipal, tendo sido identificada recentemente uma espécie de libélula protegida nesta ribeira.

Trata-se da Libélula-esmeralda (Oxygastra curtisii), o primeiro registo na região de Lisboa e Vale do Tejo. Na ribeira ocorrem também várias espécies de peixes nativos – Boga-portuguesa (Iberochondrostoma lusitanicum), Verdemã (Cobitis paludica), Escalo-do-sul (Squalius pyrenaicus) e Enguia-europeia (Anguilla Anguilla) que, tal como a libélula, são predadores dos macroinvertebrados bentónicos pelo que a sua presença é um bom indicador.

Sara Correia defende que a investigação dos alunos deve ser complementada pois, “de acordo com a Diretiva Quadro da Água, o principal instrumento da política da União Europeia relativa à água, a classificação da qualidade de uma massa de água deve ter em consideração vários critérios de qualidade (biológicos, físico-químicos e hidromorfológicos).”

Para Selma Rodrigues estes resultados “poderão dever-se ao local onde foi realizada a recolha e época de amostragem”. Realça ainda que este “município realiza há vários anos a biomonitorização dos seus cursos de água em colaboração com a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Esta metodologia permite avaliar o nível de poluição das águas (por hidrocarbonetos aromáticos policíclicos) recorrendo a musgos como biomonitores. Com base nestas monitorizações, a ribeira da Laje tem revelado concentrações reduzidas de poluentes, por vezes abaixo do nível de deteção. Existem, no entanto, focos de perturbação junto às áreas mais urbanizadas, relacionadas com a atividade humana”.

A Ribeira da Lage apresenta um elevado potencial ecológico[3]: Para a proteger “é necessário recorrer a instrumentos de ordenamento do território que visem a prevenção da destruição dos habitats e fiscalizar o cumprimento de legislação ambiental”, defende Sara Correia. Segundo Selma Rodrigues “o município de Oeiras procede ao desassoreamento regular das principais linhas de água municipais e à remoção de lixo do leito, sendo ainda intenção do município investir no restauro de galerias ripícolas e na renaturalização de margens das ribeiras, existindo já um projeto de renaturalização previsto para um troço da ribeira da Laje e previsão de plantação de vegetação autóctone”.

É também um dever de cidadania adotar ações individuais que contribuam para a proteção dos rios e dos ecossistemas.

 

 

 

 

 

Ana Francisca Martins, Carolina Gomes, Inês Braz, Inês Pereira, Lara Gonçalves, Pedro Nunes, Sofia Falcão, Sofia Pereira

Prof. João Gomes

8.º ano, turma A

Colégio Valsassina

 

Agradecimentos:

Dra. Sara Correia, da Associação Zero, por toda a atenção, apoio e disponibilidade demonstrada durante a realização deste trabalho.

Dra. Selma Rodrigues. Chefe de Divisão, Divisão de Gestão Ambiental. Departamento de Ambiente e Qualidade de Vida, Câmara Municipal de Oeiras. A sua disponibilidade e contributo foi essencial para a compreensão do assunto e para a elaboração do nosso trabalho.

[1] http://ecofun.fc.ul.pt/Docs/2011/oeirasactualn208dez_jan2011_ribeiras.pdf. Consultado em 10 de maio de 2020.

[2] https://ambiente.cascais.pt/sites/default/files/2o_relatorio_ribeiras_de_cascais.pdf. Consultado em 20 maio de 2020.

[3] https://ambiente.cascais.pt/sites/default/files/ribeiras_de_cascais_1o_relatorio.pdf. Consultado em 10 de março de 2020.

Referências bibliográficas

[1] Alba-Tercedor, J. (1996). Macroinvertebrados acuaticos y calidad de las aguas de los rios. Proceedings IV Simposio sobre el agua en Andalucía, Vol. II, Almeria, Instituto Tecnológico Geominero de España, Madrid, 203-213.

[2] http://www.cm-oeiras.pt/pt/pesquisa/paginas/results.aspx?k=Tags:ribeira+da+lage. Consultado em 30 de maio de 2020.

[3] http://ecofun.fc.ul.pt/Docs/2011/oeirasactualn208dez_jan2011_ribeiras.pdf. Consultado em 10 de maio de 2020.

[4] https://ambiente.cascais.pt/sites/default/files/2o_relatorio_ribeiras_de_cascais.pdf. Consultado em 20 maio de 2020.

[5] https://ambiente.cascais.pt/sites/default/files/ribeiras_de_cascais_1o_relatorio.pdf. Consultado em 10 de março de 2020.

Ana Francisca Martins, Carolina Gomes, Inês Braz, Inês Pereira, Lara Gonçalves, Pedro Nunes, Sofia Falcão, Sofia Pereira