Deixou o conforto do litoral, escolheu o interior esquecido de Portugal, porquê esta escolha?
Foi o gosto pela natureza. Só após viver cá é que podemos sentir esta sensação única e tão humana, que é viver em harmonia com a natureza. Esta autenticidade presente aqui, acaba por ser uma paixão que me fez fixar aqui, inicialmente como jovem estudante a tentar lutar contra a extinção de uma raça. Senti que fiz a diferença, cumpri um papel na sociedade e contribui para o equilíbrio da coesão territorial nacional. Penso ser um pequeno exemplo de que também existe qualidade de vida no interior, pois tento promover um desenvolvimento económico associado à natureza, o chamado capital natural.
Como é que o seu percurso de vida o levou a desenvolver a sua paixão?
Vim de Esposende, uma cidade no litoral e fui estudar para Vila Real, onde existe uma forte ruralidade. Sempre estive ligado à recuperação e tratamento de animais selvagens, através de uma associação, que ajudei também a desenvolver, o Núcleo do Estudo e Proteção do Ambiente. Descobri o Parque Natural do Douro Internacional, uma região única de Portugal e, a partir daí, apaixonei-me pelo mundo rural e pelo mundo selvagem desta região.
E quando começou esta aventura com o Burro de Miranda?
Terminei o curso em 2001 com a ideia de trabalhar em Trás-dos-Montes. Por coincidência, surgiu uma oportunidade de dinamizar um projeto que pretendia proteger da extinção esta raça particular, o Burro de Miranda, e apoiar à dinamização da AEPGA – Associação para o Estudo e Proteção do Gado Asinino.
Este animal é particular para si, mas o que o levou a apaixonar-se por ele?
É um animal extremamente dócil, esta foi uma das razões para ser uma das primeiras espécies a ser domesticadas. O burro terá sido o animal que convive há mais tempo com o Homem, há cerca de 6000 anos, pois é um animal que gosta do contacto com o Homem. É amistoso, de fácil trato, muito estoico e resistente, o que faz dele um animal particular. Para quem não conhece, tem de conhecer! O burro tem um potencial enorme como animal doméstico e de companhia para quem tem espaço para desfrutar da sua presença. É um animal que nos conquista com muita facilidade, um amigo, uma companhia. Conheço casos em que o burro sofre, fica deprimido pela morte do seu dono, e mesmo não falando a nossa língua, percebe-se as suas emoções. Impossível não me apaixonar por estes animais, porque eles são tão fascinantes, afetuosos e um excelente animal de companhia.
A dedicação ao associativismo não foi a escolha mais cómoda como veterinário. Que retrospetiva tem sobre este percurso?
O trabalho associativo na área da proteção animal não deveria ser tão difícil, deveria existir outra forma de distribuição de fundos de desenvolvimento rural, é uma luta quotidiana para superar as nossas dificuldades. É preciso muita resiliência para conseguir ultrapassar tantos obstáculos e frustrações por não acreditarem naquilo que desenvolvemos. No entanto, o reconhecimento dos animais, das pessoas e das comunidades locais, compensa e faz-nos esquecer as coisas menos boas.
Esta sua longa missão de salvar e proteger o Burro de Miranda foi cumprida?
Estamos no bom caminho! De facto, passando 20 anos, a raça do Burro de Miranda tem um futuro mais risonho. Há mais nascimentos, a população está mais rejuvenescida e espalhada pelo país e foi importante criar sustentabilidade económica associada à proteção desta espécie. A missão inicial de salvar o burro de Miranda foi cumprida, ajustamos novos objetivos. Inicialmente, a grande preocupação era salvar da extinção esta raça autóctone, hoje em dia, os grandes desafios são manter a qualidade de vida e o bem-estar deste e de outros animais.
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