Jovens Repórteres para o Ambiente: alunos em defesa do planeta

“Antes pensava-se que os céus eram tão azuis ao ponto de nada destruir a sua cor e que a água era infinita”, diz Margarida Gomes, referindo-se a um pensamento utópico do passado. Hoje, sabemos que, no mundo, nada é eterno e que é preciso acionar meios para o preservar. A coordenadora nacional do programa Jovens Repórteres para o Ambiente (JRA) acredita que o jornalismo e a informação podem ser contributos preciosos na defesa do ambiente.

“Temos a obrigação de estar informados. Se isso se traduz em mudança é outra conversa, mas temos de saber as consequências destas questões do ambiente.”  Com base nesta convicção, em 1994, nasceu o programa Jovens Repórteres para o Ambiente (JRA). Apesar de não ter surgido, desde logo, no seio da Associação Bandeira Azul de Ambiente e Educação (ABAAE), foi com esta organização que o JRA se desenvolveu e atingiu, a par dos programas congéneres como o Eco-Escolas, a Bandeira Azul e o Green Key, entre outros, a sua maturidade e importância. A Foundation for Environmental Education (FEE), o organismo internacional que é representado em Portugal pela ABAAE, viu no País uma forte adesão aos diversos programas-escolas, tendo sido Portugal um dos primeiros a adotar estas iniciativas.

Como professora de Geografia no ensino secundário, Margarida Gomes foi uma das primeiras pessoas em Portugal a sentir os “ventos de mudança” do ensino para o ambiente em Portugal. “Foi na minha escola, a Escola Secundária Ferreira Dias, que se testou inicialmente o projeto JRA”, refere. Este pioneirismo em território nacional fez com que o gosto pela causa crescesse cada vez mais. Ainda assim, os motivos desse interesse vão muito para além da componente profissional. “É que eu fui mãe em 1990. Quando uma pessoa é mãe ou pai faz mais sentido pensar a nível de futuro e que mundo vamos deixar para os filhos. Não herdámos a terra dos nossos pais, pedimo-la emprestada aos nossos filhos.” Por essa altura, sucedeu outro acontecimento determinante: em 1992, teve lugar a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, vulgarmente conhecida por ECO-92. A cimeira foi uma viragem decisiva a nível internacional, nomeadamente pelo estabelecimento da Agenda 21. O documento visa sensibilizar o comprometimento dos Estados e de diversas organizações e empresas a refletir sobre soluções para os problemas socioambientais para depois entrarem em ação. Todas estas efemérides vieram a confluir com a própria formação de base em Geografia de Margarida Gomes, e que, como menciona, “já aborda as questões de sustentabilidade no território a nível natural e humano”.

Numa altura em que é possível agrupar a problemática em três níveis – climático, poluição e resíduos e conservação da biodiversidade – , a professora considera que, atualmente, existe uma maior tendência para a manifestações públicas sobre estes temas, desde logo por intermédio de figuras mediáticas, como António Guterres, secretário-geral da Organização das Nações Unidas. Ainda que, no passado, já houvesse divulgações diversas sobre as temáticas do ambiente, Margarida Gomes considera que “atualmente há mais consciência e talvez mais preocupação em dar voz a estas áreas, mas também em comunicar estudos e trabalhos nesta matéria”. No entanto, refere que “hoje em dia, essas divulgações, sejam elas em revistas ou em jornais, não se encontram muito especializadas, uma vez que já são assuntos cuja ordem integra a comunicação em geral”.

Comunicar nos “novos tempos”

A adaptação aos novos tempos foi gradual, uma vez que, quando o projeto foi criado, nos anos 1990, a escassa existência da internet nas escolas parecia ser uma dificuldade para o projeto. Hoje em dia, esse problema está resolvido, mas surgem outros desafios. Margarida Gomes constata que “muitas vezes, as escolas não possuem os recursos necessários para apoiar os jovens na execução do projeto”. Além disso, a docente sublinha que é essencial que os jovens tenham interesse, tanto na comunicação jornalística, como nas questões ambientais e de sustentabilidade. “Ser um jovem repórter para o ambiente é muito mais do que, simplesmente, procurar informações na internet: requer ter a disposição para investigar e ir ao terreno e entrevistar pessoas. Portanto, conjugar estes fatores nem sempre é fácil”, explica.

Em relação à sensibilidade para as questões ambientais, a docente considera que “os jovens estão mais informados do que estavam antes”. O conhecimento e o interesse em si parecem não ser suficientes. “O objetivo do projeto não é simplesmente sensibilizar e informar. Esse é o apenas primeiro nível”, clarifica a coordenadora. O programa procura trabalhar com os jovens, de forma que sejam capazes de “agir, influenciar e mudar.”

A preocupação em combater estes desafios e em motivar os jovens a agir tem impulsionado o desenvolvimento de novos métodos de atuação. O programa tem-se aproveitado da comunicação “na vertical”, tendo em conta o cada vez maior destaque no cenário atual. “Este ano, por exemplo, temos um concurso de reels ou tiktoks”, explica.

Os profissionais responsáveis pelo programa têm continuado a tentar inovar os seminários por dar aos jovens a possibilidade de “não só ter contacto com outros jovens, mas também com técnicos especializados na área do jornalismo que os possam instigar”. O projeto tem ainda proporcionado oportunidades para que jovens participem em conferências internacionais importantes, como as conferências das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, ou “COP”. “Sempre que há uma COP, costumamos enviar um jovem. É um aspeto interessante que dá um boost ao programa”, refere.

Margarida Gomes faz questão de distibguir os JRA de outras iniciativas semelhantes, como o Eco-Escolas, cujo impacto é nomeadamente a nível social e das estruturas. Os JRA têm uma maior influência no sentido individual. “Ao nível dos JRA, diria que a mudança é mais ao nível do indivíduo”, esclarece. A diretora do programa salienta que “os Jovens Repórteres para o Ambiente dão oportunidades aos participantes para explorar o interesse que têm em áreas como o ambiente e o jornalismo, podendo, dessa maneira, ajudar algum jovem a trabalhar este gosto por comunicar”.  Vários são os casos de sucesso profissional: “Estou-me a lembrar de um JRA que esteve na missão de Góis, em 2017, que agora é jornalista na TSF.”

Será o jornalismo ambiental marcado por um discurso tendencialmente negativo, como tantas vezes é referido? A coordenadora do programa admite a tendência, mas reconhece que o programa e o jornalismo em geral beneficiam muito mais por agir de forma positiva: “Acreditamos que resulta melhor evidenciar as boas práticas e divulgar os bons exemplos do que ir sempre pela negativa.”

Por fim, a professora deixa um apelo aos alunos da licenciatura em Jornalismo, da Escola Superior de Comunicação Social, frisando que não é apenas um programa destinado aos primeiros ciclos de estudo:“Participem nos JRA, uma vez que temos poucos jovens mais velhos e gostávamos muito de aumentar a esse nível.” A professora invoca também “os estudantes a continuar a informar-se sobre a sustentabilidade, mesmo que, por vezes, tenham certos preconceitos ambientais, porque o jornalismo tem de assumir uma posição imparcial e ouvir as várias vertentes”. Como defende a professora, “tomar esta posição é fundamental, pois o futuro coletivo depende disso para sempre”.

Rodrigo Miranda e João Pedro